Agromisticismo Durante cerca de uma década fui presença regular numa quinta muito bonita para as bandas de Idanha-a-nova. Os proprietários eram alemães e, como é típico, geriam-na como se esta fosse uma embaixada rural-alternativa da Alemanha. Certo dia, quando os donos estavam ausentes, apareceu um bando de putos “iluminados”, estilo ariano Hare Krishna. Deveriam fazer algum trabalho voluntário (como combinado), mas só ficavam meditando e enchendo a barriga à custa do meu árduo trabalho na horta (o calendário acabara de anunciar a chegada do Verão e as temperaturas beiravam os 40Cº!) e com os animais (havia muita variedade de bichos domesticados; e eu mesmo ordenhava as ovelhas, fazia o queijo e curava-o por meses, para apreço de todos). Durante uma semana fiquei calado com tamanho abuso dos folgados pseudoesotéricos. Até que o “meu sangue ferveu”! Mesmo procurando manter a calma, dei-lhes um ultimato: eu deveria sair no dia seguinte e só regressaria à noite; e eles teriam que fazer algum trabalho na horta (rega e monda manual, basicamente) durante a minha ausência. Se não fizessem isso, eu pegaria na mochila e partiria, deixando-os entregues à sua sorte. Pois bem, ao crepúsculo do dia seguinte, mal cheguei à quinta, fui direto verificar a horta, constatando que nenhum trabalho tinha sido ali feito desde a última vez que eu lá estivera. Fiquei agastado! Percorrer as restantes duas centenas de metros que separam a horta da casa principal (depois de uma prazenteira caminhada que me ocupou o dia inteiro), por entre um denso montado, àquela hora vibrante de encantadores cantos da avifauna e de insetos, permitiu-me acalmar. Mesmo assim, reuni-me com os jovens em causa (todos burguesinhos que se achavam demasiado especiais para trabalhar duro). Mal eu tinha começado a dar-lhes conta do meu desapontamento, eles interromperam-me, atestando (com sinceridade quase lacrimejante) que tinham mondado a horta. Tal mentira agravou de sobremaneira o meu estado de espírito, convencido de que me achavam o maior imbecil do mundo. Mas eles explicaram-me que se tinham reunido, sentados em posição de lótus, ao redor da horta, e rezaram em uníssono para que a Mãe Natureza não fizesse brotar ervas daninhas naquele espaço. E logo se foram embora com a sensação do dever cumprido, a caminho de assaltar a bem suprida dispensa. Palhaçada! Depois ri-me bastante, mas naquele dia, não vendo a utilidade de me envolver em acaloradas discussões, cumpri a minha palavra, deixando-os por conta própria num local bem remoto e praticamente sem comunicação com o exterior (foi num tempo pré telemóveis e eles não falavam uma palavra de português). Saindo dali, resolvi visitar uma comunidade alternativa no nordeste do Alentejo. Também eram alemães. Só lá fiquei um dia... As suas crianças não eram autorizadas a dormir dentro de casa. Ao invés, forçavam-nas a pernoitar - mesmo no Inverno! - em extremamente rudimentares choças de pastores, feitas de giestas e alguns paus amarrados com sisal. A teoria era que assim enrijeceriam e cresceriam saudáveis. Porém, tinham acabado de construir uns bangalôs bem giros e confortáveis para fins turísticos. Não pude deixar de reparar que quase todos naquela comunidade apresentavam uma enodoada coleção de dentes cariados. E isso devia-se a que grande parte de sua dieta era constituída por mel, com a agravante das suas lideranças se oporem duramente à lavagem dos dentes e nem pensar em visitar um dentista! Esses profissionais de saúde eram demonizados! Mal cheguei, o patriarca-guru submeteu-se a um interrogatório pleno de bizarria desconfortável. Nem vou entrar em detalhes. Mas vale a pena referir uma parte do diálogo em que o velhote revelou algo sobre ele, a fim de perceberem que tipo de chalupa eu estava a lidar. Disse-me que precisava regressar à Alemanha e ficar por lá um par de meses. Estava a adiar essa viagem porque não conseguia encontrar uma mulher lactante que o acompanhasse o tempo todo. Não resisti em perguntar (embora no fundo soubesse a desconcertante resposta) a razão de ele ter como acompanhante especificamente uma mulher lactante. “ É que fora da minha quinta a comida está quase toda contaminada. E na Alemanha, sobretudo depois do desastre de Chernobyl, todos os produtos agrícolas estão radioativos e tóxicos. Por isso, só lá vou se puder chupar leite de uma mulher daqui como única fonte de alimento” - respondeu-me com um apodrecido sorriso de gula concupiscente.
@Xando3725 ай бұрын
A seguir, durante um par de semanas, fiz trabalho voluntário noutra quinta *alternativa* em Ferreira do Alentejo. Fugindo ao padrão, desta feita o dono (por mera herança) e metade dos seus habitantes eram portugueses. Mas também ali o ambiente humano deixava muito a desejar. Foi penoso assistir à decadência desleixada da quinta e aos conflitos internos dominados principalmente por ciúmes que corroíam severamente as relações interpessoais, assim como qualquer projeto de vida rural que tentaram germinar. As crianças resultantes dessas relações mal resolvidas eram desprovidas de existência legal, pois os respectivos pais não quiseram registrar os seus nascimentos. Neste ponto, a ninguém será difícil deduzir que aquela malta estava dominada por teorias da conspiração das mais imbecis e danosas, opondo-se à vacinação, tornando os gaiatos não só demasiado vulneráveis a doenças graves e facilmente evitáveis através da inoculação profilática, mas também incubadoras ambulantes de novas estirpes patogénicas que vão boicotando os esforços da vacinação maciça. Apesar de pregarem o vegetarianismo, uma das principais fontes de rendimento dessa quinta (onde metade tinha uma existência parasitária) era a venda de carne de porco. Esses animais eram mortos com tiros de carabina e esquartejados ao ar livre, desrespeitando regras basilares de higiene (configurados em Lei). De alguma forma, tinham convencido um veterinário amigo (e criminosamente irresponsável) a fornecer-lhes certificados de que os porcos em causa tinham sido vacinados, quando aqueles animais eram criados e comercializados como ameaças à saúde pública, desvirtuando completamente os benefícios e as regras da pecuária biológica. Cansado de procurar a “minha tribo” nesse meio, e precisando de sobreviver economicamente, fui trabalhar (remuneradamente) para o Gerês. Por lá fiquei uns meses, até o frio afugentar os turistas que gostam de atividades de considerável esforço físico ao ar livre. Na volta, decido visitar a quinta duns ingleses. Fiquei apenas um fim de semana e deu-se a infeliz coincidência de assistir a uma discussão familiar triste, mas interessante. A filha, no final da adolescência, manifestou toda a sua vergonha irada por ter um pai cabeludo, ameaçando sair de casa e sumir no mundo se ele não cortasse o cabelo. O coitado resignou-se a perder a farta guedelha rastafári que simbolizava grande parte da sua identidade. Como é comum entre “alternativos” neo-rurais, essa família fazia um bom pecúlio organizando e ministrando cursinhos onde quase nada de minimamente relevante se aprende, mas cuja admissão custa uma pipa de massa. É uma variante mais sacana de explorar mão de obra... Chegava a ser quase divertido como tomavam todas as decisões consultando um baralho de cartas que acreditavam ser a forma dos *anjos* comunicarem com eles... (Não, não era o *Tarot*, mas daria no mesmo.) Dificilmente encontraremos uma comunidade “alternativa” que não seja dada ao misticismo comercial (estilo loja chinesa de pseodoesoterismo), com @s respectiv@s gurus & mestres, cuja facilidade em “comunicar com o além” equivale ao seu domínio de rasas teorias da conspiração via Internet... Querem nos fazer crer que têm “poderes sobrenaturais”: seja *curando* com o simples toque das suas mãos *abençoadas* (até vendem *reiki* à distância, o que tem exatamente o mesmo efeito nulo das preces); ou inserindo cristais em cavidades corporais; ou interpretando a “influência espiritual” de certos alinhamento dos astros; *fodendo com extraterrestes*; *encarnando espíritos sábios* (com intrigante frequência dizem ser de médicos alemães...), etc... Todos eles se vangloriam de ser detentores de canais privilegiados de comunicação com “entidades sobrenaturais” (que só existem nos recônditos das suas mentes perturbadas), obtendo conhecimentos “profundos e transcendentais” através da “revelação particular” (que, por uma módica quantia, nos farão iniciados, sempre prontos a pagar por mais um módulo de aperfeiçoamento de nada...). E assim, tanto perscrutam a mente do demiurgo universal, como adivinham os planos dos *Illuminati e o ciclo menstrual das fadas.* Fantasiam com um ser ou seres que foram capazes de criar um universo infinitamente vasto e complexo, gerindo TUDO - tendo em mente tais cabeça-de-alho-chocho! É o derradeiro narcisismo que vemos nos asseclas das religiões organizadas (com a diferença que os fiéis destas últimas são mais hipócritas, disfarçando a suprema pretensão de modéstia piedosa). Alguns mais oportunistas e familiarizados com o *showbiz*, vendem “curas xamânicas” através de psicotrópicos e até festas *rave*. Alguns têm a arrogante desfaçatez de dizer que “a ciência é só um outro tipo de fé”; e aludem a *conhecimentos alternativos* que são *imunes* ao método científico... Os saudavelmente céticos (ou seja, os mais difíceis de manipular) são de imediato classificados como “seres supressivos” ( ou outra designação merdosa que justifique o anátema), alegadamente tudo contaminando com a sua “energia negativa” . Haja pachorra! Eu já não tenho...
@Xando3725 ай бұрын
Cont.) E para os que vêem essas práticas pseudocientíficas / místicas como inofensivas, deveriam prestar mais atenção ao crescimento do movimento antivacinas e o consequente ressurgimento de doenças que estavam quase erradicadas. Há muitos outros malefícios... Amiúde encontro pessoas que desenvolveram uma malsã dependência emocional de charlatães, sendo particularmente triste os casos que envolvem a morte de entes queridos e a infantil relutância de aceitar essas perdas através dum processo de luto saudável. Ao invés, gastam balúrdios com espiritualistas/médiuns que lhes dão uma chupeta psicológica embebida no agridoce embuste customizado. Neste momento estou a acompanhar com alguma proximidade o caso dum jovem de 24 anos diagnosticado com esquizofrenia, a quem um mestre (sem mestrado) do Santo Daime instigou a parar de tomar a medicação que lhe permitia ter uma vida normal, com a vã promessa de que o curaria com (bem pagas) doses regulares de ayahuasca e doutrinação esotérica. Podem imaginar o que uma droga alucinogénica provoca a alguém que já sofre de distúrbios bioquímicos no cérebro ao ponto de chegar a perder a noção da realidade, refém das suas fantasias assoladoras... já se tornou um gatilho para surtos psicóticos. Previsivelmente, a gravidade irá escalar. Ao abrigo dos privilégios legais - que raiam o absurdo - que o Estado concede às religiões, as que se organizam em torno da ingestão da ayahuasca (a União do vegetal é outro exemplo), podem inclusive administrar a droga às suas crianças!
@Xando3725 ай бұрын
Numa das várias comunidades alternativas por onde passei, havia uma mulher que afirmava ser bruxa. Era bastante popular. Sempre que ouvia os cães anunciar a chegada de visitantes (os últimos 200 metros até à casa serrana tinham um acesso exclusivamente pedonal), pegava nos binóculos para melhor avaliar o tipo de encenação que iria oferecer, e logo corria para fazer chá e colocar na varanda um número de chávenas equivalente aos inesperados convivas. Depois corria ou para a horta atrás da casa, ou para o banho. Quando lhe batiam à porta, ela fingia não os ter visto chegar e declarava misteriosa: “há vários dias que estava à vossa espera. Sabia que iriam chegar por agora”. Para o “provar”, oferecia o chá acabado de fazer. “Já vos conhecia de sonhos” - costumava acrescentar. (Charlatães destes às vezes afirmam que conseguiram essas revelações nominais através do horóscopo ou confabulando com espíritos...) Havia quem se impressionasse com esse teatro infantil, sobretudo quando a anfitriã paranormal uns dias antes já tinha sido informada (por amigos comuns) até dos nomes dos convivas que apareceriam “de surpresa”. Entre os alternativos iluminados, fartei-me de ver variações deste truque. “ A nossa ligação é antiga, de outras vidas”... - é uma das frases (proferida numa entoação hierática) que mais usam para fisgar crédulos. Mantêm um contato visual bastante intenso (até chegam a semicerrar os olhos, lobrigando/perscrutando distantes horizontes psicoespirituais), fingindo olhar fundo na “nossa alma”. Acompanha um sorriso complacente e a familiaridade forçada na voz, enquanto geralmente seguram as nossas mãos com reconfortante firmeza. E logo essa pantomima enredadora é sublinhada com frases do tipo “conheço e sinto a tua dor”... Mais do que um apelo à autocomiseração, é supostamente um reconhecimento tácito e profundo das nossas vulnerabilidades e traumas, mas também um acolhimento que permitirá libertar o nosso potencial. Neste ponto, podem ainda tentar os truques da leitura a frio e preferencialmente a quente, mas o mais provável é que a vítima crédula se abra, entregando as informações que @ embusteir@ quer e finge já ter, não lhe sendo difícil descortinar a carência de aceitação e o assoberbamento que causa a lhana sensação de pertencimento que grande parte de nós anela. A minha experiência pessoal confirma que essa é uma estratégia semelhante à dos proselitistas evangélicos (que até comummente ousam afirmar que são formados em psicologia, apesar de ser óbvio que a esmagadora maioria destes missionários e estelionatários nunca passou por uma universidade e são uma completa nulidade em termos de racionalismo e hábitos de leitura) e até dos pederastas que procuram presas fáceis entre crianças e adolescentes dolorosamente desajustados das suas famílias e comunidades. No Brasil, é costume @s curandeir@s espiritualistas e caucasian@s afirmarem que são possuíd@s pelo espírito dum médico alemão. Acredito que especificidade da nacionalidade e género desses espíritos se deva à excessiva credibilidade de casta e pedigree com que a comunidade alemã é tida por aqui.
@paperboatsdissolving5 ай бұрын
Fiquei fã deste canal e do seu trabalho! Em especial gostei deste pequeno filme. Um dia havemos de colaborar num trabalho documental entre Portugal e a Escócia ! :)
@nelsonpereira4442 Жыл бұрын
❤
@PauloRafael-xr8kf Жыл бұрын
Aldeia criada de ilusão por grandes patetas, estupidos e mentirosos, violentos e ladroes !!… falo de experiência,…dezembro 2022. De tudo, os céus não de vocês se esqueceram (!!!…)
@eduardoboucinha8838 Жыл бұрын
És Maravilhosa!!! É Lindo tudo que fazes!!!
@eduardoboucinha8838 Жыл бұрын
És Maravilhosa!!! É Lindo tudo que fazes!!!
@eduardoboucinha8838 Жыл бұрын
És Maravilhosa!!! É Lindo tudo que fazes!!!
@eduardoboucinha8838 Жыл бұрын
És Maravilhosa!!! É Lindo tudo que fazes!!!
@eduardoboucinha8838 Жыл бұрын
És Maravilhosa, é Lindo tudo o que fazes!!!
Жыл бұрын
Muito bom !!!
@PauloRafael-xr8kf Жыл бұрын
O senhor tem la andado ?!…. Passou 10anos c/ gente la a viver. Nenhuma parede foi levantada por mãos deles !!…. Só pedaços de lenhos e terra c/ água,…e disso falam de instituto de sanação ?!…. Quando ao passar la sendo residente,…te roubam tuas coisas logo tua ausência (!!!…). Projeto e projeto. Ações então são por olhar (!!!!…)
@augustafteixeira9313 Жыл бұрын
Boa!!! Onde houver alguém que pense e sinta, sobreviverá a essência do ser humano! Parabéns a todos e a quem realizou este vídeo.
Жыл бұрын
😍
@nelsonpereira4442 Жыл бұрын
Ótimo vídeo e sinopse. :-D projeto interessante.
@PauloRafael-xr8kf Жыл бұрын
Pois,…você não tem conhecimento da realidade destes indivíduos
@marcelodomingues9167 Жыл бұрын
Obrigado pelo convite 🤘😉
@finoselvagem Жыл бұрын
A essência dos artistas perfeita!
@finoselvagem Жыл бұрын
Topppppp
@nelsonpereira4442 Жыл бұрын
muito interessante.. :-D espero que continues o bom trabalho.
@FabioBeckert Жыл бұрын
👏👏
@andrerodrigues76702 жыл бұрын
"ter um timing , e não deixar enrolar enrolar as coisas." é o que retirei >.< . demorou, mas foi saudável