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As papas de milho foram, até à segunda metade do século XX, uma das principais iguarias na alimentação das populações no arquipélago dos Açores, com forte influência vinda do continente português, nomeadamente das Beiras interiores, Alta e Baixa.
Na ilha de S. Miguel, as papas grossas, ou de carolo (papas doces de milho), apesar de ainda podermos encontrar a nível comercial e doméstico, como por exemplo nos concelhos da Ribeira Grande e Povoação, irão, possivelmente, cair no esquecimento e, nos dias de hoje, já começam a ser lembradas como uma tradição: «As papas grossas do antigamente, eram grossas em grosso modos, levavam leite gordinho puro das vacas, o carolo, açúcar e para acrescentar a farinha de milho que sobejada da peneiradela para aumentar a porção» .
Na ilha de S. Miguel estas papas são confecionadas, usualmente, servindo de iguaria em período quaresmal, sobretudo na Sexta-feira Santa, dia de jejum para os católicos, em que não era permitido comer qualquer tipo de carne. Segundo um dito popular, “na Quaresma, pessoa que não comer grão não é bom cristão”. Após a época quaresmal, as papas de carolo continuavam a ser iguaria na alimentação do povo, porém acompanhadas com pé de torresmo e/ou chouriço moído. Esta combinação é frequente nas freguesias do norte do concelho da Ribeira Grande, designadamente, na Lomba da Maia.
Na ilha de S. Jorge, para a confecção destas papas, a ligação era feita essencialmente com leite, mas em muitos casos, e devido às carências financeiras, era usado o leite desnatado (aquele de que se havia retirado a gordura - nata) e, em casos extremos, nas casas mais pobres, ao leite era acrescentada água.
«Numa joeira (espécie de peneira que serve para separar as cascas do milho da farinha ou o trigo do joio) peneira-se o milho estraçoado a fim de o separar da farinha de milho. De seguida retiram-se as cascas do milho que ficam ao de cima do carolo afastando e facilitando, assim, o excesso das cascas e limpeza do carolo. Depois coloca-se o carolo a demolhar, de um dia para o outro, de modo a agilizar a respetiva cozedura. No dia que se pretende fazer as papas, coloca-se uma panela ao lume com água e o carolo, deixando-se cozer, mexendo frequentemente para não pegar no fundo do tacho. Quando cozido, junta-se a farinha de milho inicialmente separada, leite (devagar, como se fosse um fio), até engrossar, açúcar a gosto, um pouco de sal, uma colher de sopa de manteiga, casca de limão (para quem gostar) deixando-se cozer mais um pouco. Coloca-se em pratos ou tigelas e ainda quentes, polvilha-se com açúcar e canela. O açúcar derrete-se formando um melaço o que torna as papas deliciosas. Em Rabo de Peixe e depois do carolo cozido juntamos também, abóbora cozida e ralada» .
Forma de citar o texto: CHAVES, Duarte Nuno. 2022. "As papas de carolo. Memórias da alimentação no período da Quaresma" in: TASTE - Taste Azores Sustainable Tourism Experiences.
Vídeo produzido no âmbito do trabalho de campo realizado pelo projeto TASTE.
TASTE é um projeto desenvolvido pelo CEEAplA (Centro de Estudos de Economia Aplicada do Atlântico) e pelo CHAM - Centro de Humanidades da Universidade dos Açores, com a colaboração da Direção Regional da Cultura do Governo Regional dos Açores.
Projeto financiado pelo PO Açores 2020 ACORES-01-0145-FEDER-000106.